(continuação)
“Quando estávamos na carceragem da Polícia Federal em
Brasília, e eu disse ao desembargador Ricardo Regueira que, quando morresse, eu
queria ser cremado para que minhas cinzas fossem jogadas na praia, ele me
retrucou, dizendo que não deixaria isso acontecer, porque queria encontrar
comigo no Paraíso, e lá não entram os cremados.
O tempo passou, saímos da prisão, retomei as minhas
atividades no magistério, na Faculdade Nacional de Direito e palestras pelo
Brasil, recomecei a escrever, atualizando meus livros, mas para o desembargador
Ricardo Regueira a vida não conseguiu voltar ao normal, porque ele já vinha de
uma injusta acusação anterior – em que tinha sido acusado de vender sentença,
mas cujo processo acabara arquivado pelo Supremo Tribunal Federal, com o voto
do mesmo ministro Cezar Peluso, que de novo mandar prendê-lo com o argumento de
integrar ele a máfia dos caça-níqueis – e a morte do seu filho, ainda jovem,
que ele afirmava ter sido uma execução, e que nunca foi esclarecida pela
polícia, minou toda a sua resistência e ele acabou falecendo.
Sempre que eu tinha a oportunidade de falar com ele, eu lhe
dizia que tínhamos que ficar fortes, porque precisávamos sobreviver ao furacão
para não morrermos como culpados, o que seria muito do agrafo da Justiça, que
assim não precisaria nos julgar, mandando o nosso processo penal para o
arquivo.
Para quem não sabe, quando alguém é injustamente acusado,
como o desembargador Ricardo Regueira, mas morre no curso do processo, em vez
de o processo prosseguir para que a família do morto possa ter a chance de
vê-lo absolvido, para obter do Estado as reparações a que tem direito, o
processo é arquivado, porque os tribunais entendem que com a morte a
punibilidade fica extinta.”
(continua na próxima semana)
Trecho do livro OPERAÇÃO HURRICANDE: UM JUIZ NO OLHO DO
FURACÃO (Geração Editorial), encontrável em www.saraiva.com.br
e em Livraria LaSelva (nos aeroportos).
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